segunda-feira, 12 de novembro de 2018



Início da safra de castanha aquecerá economia no Acre e Bolívia
* Ecio Rodrigues
A integração comercial entre Brasil e Bolívia vai bem além da existência e funcionamento do gasoduto que abastece o Sudeste brasileiro com o gás boliviano.
Na fronteira entre o Estado do Acre (Brasil) e o Departamento de Pando (Bolívia), a dinâmica econômica todos os anos se intensifica, com o início, em dezembro, da safra oriunda de uma árvore emblemática da Amazônia: a castanheira, ou Bertholletia excelsa.
A comercialização do fruto dessa árvore, antes identificado como castanha-do-pará (já que até meados da década de 1980 era exportado exclusivamente pelo porto de Belém), depois como castanha-do-brasil, e mais recentemente, devido a razões de mercado, como castanha-da-amazônia, representa mais da metade da renda anual dos produtores florestais que habitam ambas as localidades.
Como uma boa parcela da produção é vendida de um país para o outro, sempre que começa a safra anual tem lugar a discussão que contrapõe, de um lado, as exigências impostas a esse comércio, e de outro, a informalidade em que ele se processa.    
Trata-se, obviamente, de uma operação de exportação/importação – quer dizer, de um procedimento administrativo-fiscal que exige muitos carimbos e, pelo menos no caso do Brasil, o recolhimento de pesados impostos.
O trâmite também requer o cumprimento de normas de vigilância sanitária, diante da natureza alimentar do produto – com o agravante de que envolve séria ameaça à saúde humana, por conta do risco de contaminação pelo fungo aflatoxina (pois grande parte da castanha é negociada in natura, ou seja, com casca).
Entretanto, considerando-se que a compra e venda se dá numa região de fronteira, e que, para consumar a transação, basta que as cargas de castanha atravessem, geralmente por canoa, um rio estreito, com menos de 100m de largura, tanto os acreanos quanto os bolivianos estão pouco se lixando para as formalidades.
Em suma, é o pior dos mundos – a combinação entre excesso de burocracia e total indiferença aos preceitos normativos. Quem perde, claro!, é a sociedade.
Em áreas de fronteira, como se sabe, ocorre acentuada movimentação de pessoas e produtos, e amiúde as populações vizinhas mantêm estreitas relações pessoais e comerciais. É comum uma mesma família se dividir entre os territórios fronteiriços, como é comum viver num país e trabalhar no outro.
O fato é que, no caso da castanha-da-amazônia, as regras de importação e exportação que valem para o restante do país não podem ser as mesmas para a região de fronteira onde o produto é extraído. É evidente que essas regras devem ser flexibilizadas.
Embora sejam compreensíveis as preocupações do fisco e da vigilância sanitária, é questão de bom senso o estabelecimento de condições comerciais que sejam interessantes para os dois países.
Por sinal, por ocasião da construção das pontes ligando os municípios acreanos de Brasileia e Assis Brasil às cidades de Cobija e Iñapari (Bolívia e Peru, respectivamente), havia a expectativa de que o comércio da amêndoa e as relações econômicas de forma geral avançariam.
Todavia, as pontes não trouxeram progresso significativo às trocas comerciais entre essas nações, sobretudo no que diz respeito à castanha. Faltou, tanto à época quanto agora, associar a ligação física à redução das exigências alfandegárias, elemento essencial para melhorar o ambiente de negócios.
Espera-se, para a safra de castanha-da-amazônia que se inicia em dezembro próximo (e que vai até março/2019), a recuperação da produção aos patamares da média anual de 40 mil toneladas – bem superior à pífia safra de 2017, que não passou de 10 mil toneladas.
A flexibilização das regras de exportação da castanha-da-amazônia fomentaria a economia do Acre. Simples assim.

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

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