domingo, 21 de julho de 2019



Planeta precisa de 1,2 trilhão de novas árvores para equilibrar o clima
* Ecio Rodrigues
Desde que o aquecimento do planeta passou a ser entendido como verdade científica, e que os países associados às Nações Unidas, ONU, passaram a enfocar a redução de carbono na atmosfera como medida imprescindível para reverter o aumento na temperatura, o plantio de árvores se tornou uma opção inteligente – e prioritária.
Pois um grupo internacional de conceituados cientistas logrou calcular a quantidade de árvores que o mundo deve plantar, hoje, para contornar os efeitos da atual e mais longa crise ecológica enfrentada pela humanidade.
O estudo foi divulgado pela igualmente conceituada revista científica Science, em 5 de julho último.
Pelos cálculos dos pesquisadores – e a despeito dos esforços para manter as florestas nativas já existentes –, os países deverão plantar a expressiva quantidade de 1,2 trilhão de novas árvores, o que representa quatro vezes mais o número de árvores nativas existentes na Amazônia.
Quer dizer, muito embora atualmente existam cerca de 3 trilhões de árvores adultas em todo o planeta, a fim de minimizar os efeitos das mudanças no clima são necessários 4,2 trilhões de árvores, no total.
Mas onde plantar as mudas? A resposta é bem mais simples do que se imagina: onde antes havia florestas – por exemplo, nas áreas desmatadas para pasto e abandonadas depois de terem sido destinadas à criação de boi.
As áreas disponíveis para receber as árvores foram identificadas e mapeadas, constituindo-se de terras ociosas, que não estão sendo utilizadas com fins econômicos.
Mais de 50% dessas terras se concentram em 6 países: Rússia (151 milhões de hectares); Estados Unidos (103); Canadá (78); Austrália (58); Brasil (50); China (40).
Ainda que a demanda em relação ao plantio de novas árvores seja pauta recorrente nas reuniões da ONU, o estudo publicado na Science tem o mérito de trazer à tona as cifras implicadas no reflorestamento global, que são impressionantes – seja pela colossal quantidade de árvores a serem plantadas, seja pelo altíssimo investimento financeiro requerido.
Todavia, uma vez concretizado o reflorestamento, o resultado também será impressionante: o trilhão de novas árvores irá retirar 25% de todo carbono presente na atmosfera, levando os níveis desse gás a regredir aos padrões observados no período da Revolução Industrial.
Outra revelação importante da pesquisa diz respeito à informação de que, em média, uma árvore leva até 18 anos para ser considerada adulta e prestar, de maneira plena, o serviço de retirar e estocar o carbono lançado na atmosfera.
Significa dizer que, para atingir as metas estipuladas no Acordo de Paris e não ultrapassar o limite de 1,5 graus Celsius de aumento na temperatura planetária até 2050, estabelecido pelo IPCC (painel da ONU que reúne mais de 3.000 cientistas), a humanidade terá que se apressar, pois o prazo para plantar árvores já começou.
Mas os pesquisadores reconhecem as dificuldades que cercam a organização de um arranjo dessa envergadura, envolvendo praticamente todas as nações do mundo e uma extraordinária área de terras degradadas (de natureza privada e pública), a serem aradas para o cultivo das árvores. Certamente será necessário conceber mecanismos de fomento para atrair os proprietários.
Comprovação científica não falta: aos brasileiros, já não basta zerar o desmatamento da Amazônia, também precisamos plantar uns tantos milhões de árvores. Quando vamos começar?    

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

segunda-feira, 8 de julho de 2019



Trocando túmulos por árvores e cemitérios por florestas
* Ecio Rodrigues
Embora o Brasil detenha a maior parte da floresta amazônica e a maior área de floresta tropical nativa do mundo, a ideia de oferecer aos mortos a possibilidade de passar a eternidade numa floresta, e não num cemitério tradicional, não partiu daqui.
A empresa de experimentação (ou startup, da denominação em inglês) “Better Place Forests” funciona com escritório em São Francisco e tem público prioritário no Vale do Silício, onde conseguiu captar 12 milhões de dólares em capital de risco para emplacar a novidade das florestas-cemitério.
Sem apelar ao financiamento público, esse tipo de iniciativa, de base tecnológica e voltada para desenvolver um modelo de negócio, é bastante comum nos Estados Unidos e mais comum ainda no famoso cluster de informática: quem tem uma ideia inovadora consegue reunir investidores que arriscam seu próprio dinheiro para aperfeiçoar o projeto e lançá-lo no mercado.
A investigação sobre as razões para o fracasso das startups ocupa razoável esforço de pesquisa, já que muitas fecham nos dois primeiros anos. Encabeçam o ranking dos fatores de insucesso problemas objetivos, relacionados à gestão do empreendimento, e subjetivos, como falta de amadurecimento do mercado para assimilar as propostas inéditas.
Com relação à “Better Place”, parece que o maior risco se insere no quesito subjetivo. A pergunta a ser respondida nos próximos anos é se a sociedade, ou o mercado, irá aderir ao propósito radical de transformar cemitérios em florestas.
No modelo testado, as cinzas de uma pessoa, ou dos membros de uma família, são espalhadas dentro de um bosque, à sombra de uma árvore – que passa a ostentar uma placa em bronze com o nome dos entes falecidos. Completa a estrutura oferecida um centro de convivência para uso dos visitantes.
O site https://www.betterplaceforests.com traz informações sobre os planos negociados. O mais barato custa US$ 970,00, destinado aos clientes que concordarem em dividir a sombra de sua árvore com estranhos.
Para quem quer exclusividade, o pacote de serviços, incluindo a conservação das árvores e da floresta, fica entre US$ 3.000,00 e US$ 30.000,00, por pessoa, ou família. Os preços variam, de acordo com a espécie e a idade da árvore escolhida.
Duas áreas de florestas já estão disponibilizadas aos interessados que desejem comprar sua árvore-memorial, ambas na Califórnia: Santa Cruz e Point Arena. Para cada árvore adquirida, a empresa se compromete a plantar até 400 novas mudas.
Do ponto de vista econômico, argumenta-se que os custos de manutenção e de instalação dos cemitérios tradicionais, sobretudo em função do valor imobiliário de localização, são muitos superiores aos praticados pelas necrópoles na floresta.  Contudo, o maior diferencial reside mesmo na sustentabilidade ecológica.
É óbvio, por outro lado, que traz mais conforto espiritual cuidar de uma árvore, ao invés de um túmulo – e visitar uma floresta, no lugar de um cemitério.
Enquanto, em praticamente todo o mundo, o principal obstáculo ao impulsionamento do negócio certamente reside na escassez de florestas, na Amazônia, esse não é o problema.
Por aqui, encontrar uma área florestal para converter em cemitério até que é fácil. Mas fazer virar cinza – os mortos, não as árvores –, nem tanto.


*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.