Trocando túmulos por
árvores e cemitérios por florestas
* Ecio Rodrigues
Embora
o Brasil detenha a maior parte da floresta amazônica e a maior área de floresta
tropical nativa do mundo, a ideia de oferecer aos mortos a possibilidade de passar
a eternidade numa floresta, e não num cemitério tradicional, não partiu daqui.
A empresa
de experimentação (ou startup, da denominação em inglês) “Better Place Forests”
funciona com escritório em São Francisco e tem público prioritário no Vale do Silício,
onde conseguiu captar 12 milhões de dólares em capital de risco para emplacar a
novidade das florestas-cemitério.
Sem
apelar ao financiamento público, esse tipo de iniciativa, de base tecnológica e
voltada para desenvolver um modelo de negócio, é bastante comum nos Estados
Unidos e mais comum ainda no famoso cluster de informática: quem tem uma ideia inovadora
consegue reunir investidores que arriscam seu próprio dinheiro para aperfeiçoar
o projeto e lançá-lo no mercado.
A
investigação sobre as razões para o fracasso das startups ocupa razoável
esforço de pesquisa, já que muitas fecham nos dois primeiros anos. Encabeçam o ranking
dos fatores de insucesso problemas objetivos, relacionados à gestão do
empreendimento, e subjetivos, como falta de amadurecimento do mercado para
assimilar as propostas inéditas.
Com
relação à “Better Place”, parece que o maior risco se insere no quesito
subjetivo. A pergunta a ser respondida nos próximos anos é se a sociedade, ou o
mercado, irá aderir ao propósito radical de transformar cemitérios em
florestas.
No
modelo testado, as cinzas de uma pessoa, ou dos membros de uma família, são espalhadas
dentro de um bosque, à sombra de uma árvore – que passa a ostentar uma placa em
bronze com o nome dos entes falecidos. Completa a estrutura oferecida um centro
de convivência para uso dos visitantes.
O
site https://www.betterplaceforests.com traz informações
sobre os planos negociados. O mais barato custa US$ 970,00, destinado aos
clientes que concordarem em dividir a sombra de sua árvore com estranhos.
Para
quem quer exclusividade, o pacote de serviços, incluindo a conservação das
árvores e da floresta, fica entre US$ 3.000,00 e US$ 30.000,00, por pessoa, ou
família. Os preços variam, de acordo com a espécie e a idade da árvore escolhida.
Duas
áreas de florestas já estão disponibilizadas aos interessados que desejem
comprar sua árvore-memorial, ambas na Califórnia: Santa Cruz e Point Arena.
Para cada árvore adquirida, a empresa se compromete a plantar até 400 novas
mudas.
Do
ponto de vista econômico, argumenta-se que os custos de manutenção e de
instalação dos cemitérios tradicionais, sobretudo em função do valor
imobiliário de localização, são muitos superiores aos praticados pelas
necrópoles na floresta. Contudo, o maior
diferencial reside mesmo na sustentabilidade ecológica.
É
óbvio, por outro lado, que traz mais conforto espiritual cuidar de uma árvore,
ao invés de um túmulo – e visitar uma floresta, no lugar de um cemitério.
Enquanto,
em praticamente todo o mundo, o principal obstáculo ao impulsionamento do
negócio certamente reside na escassez de florestas, na Amazônia, esse não é o
problema.
Por
aqui, encontrar uma área florestal para converter em cemitério até que é fácil.
Mas fazer virar cinza – os mortos, não as árvores –, nem tanto.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de
Brasília.
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