quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

Em 2022, desmatamento elevado e sabotagem do Fundo Amazônia minaram sustentabilidade da Amazônia

 * Ecio Rodrigues

O governo que se despede em 2022 deixa aos brasileiros um prejuízo descomunal, resultante da destruição, nos últimos 4 anos, de 45.586 km2 de biodiversidade florestal na Amazônia.

Além da perda dessa riqueza estratégica representada pela biodiversidade, a cada ano de fracasso do governo na conservação das florestas e, por conseguinte, no controle do desmatamento, a Amazônia se afasta da sustentabilidade ecológica e econômica.

O país amarga, por óbvio, as consequências desse distanciamento, uma vez que os danos vão ficando cada vez maiores e difíceis de ser ressarcidos.

Estudos apontam o limiar de 25% de devastação para a floresta nativa atingir o ponto de ruptura – a fronteira a partir da qual não há mais retorno. Dali em diante o ecossistema natural já não conseguirá se reconstituir e retornar ao estado anterior.

No caso da Amazônia, conforme demonstram as evidências, se esse limite for ultrapassado o bioma floresta tropical irá se converter numa espécie de savana, sofrendo drástica redução na quantidade e na qualidade da fauna e da flora.

Sem falar dos efeitos ecológicos e sociais, o prejuízo econômico decorrente dessa mutação provavelmente será cobrado das futuras gerações num prazo bastante curto, que pode ser de até 15 anos.

Em 2019 – isto é, já no primeiro ano da atual gestão –, o Fundo Amazônia, o mais importante sistema de fomento na área ambiental do país, gerenciado de maneira eficiente pelo BNDES e por isso consolidado no complexo arcabouço da administração pública federal, parou de funcionar.

Fruto de muito esforço, o fundo existe desde 2008, destinando-se a captar recursos doados pela cooperação internacional e a financiar ações e projetos direcionados, por sua vez, a zerar o desmatamento.

Pode-se dizer, assim, que o organismo é herdeiro do PPG7, programa piloto patrocinado pelo G7 e que durante a década de 1990 possibilitou o investimento na Amazônia, a fundo perdido, de mais de 200 milhões de dólares (em valores da época), viabilizando a criação e a institucionalização da política de meio ambiente.

A partir de 2019, entretanto, todo o dinheiro depositado no fundo ficou inacessível por decisão dos países doadores – uma reação aos ataques dos gestores ambientais à ajuda financeira prestada à Amazônia pela cooperação internacional.

Diante desse congelamento – provocado pelo próprio governo, que dependida dos recursos retidos –, uma quantia que pode chegar à casa dos bilhões de dólares deixou de ser aplicada no combate à destruição florestal.

Ou seja, por mais paradoxal que pareça, o governo, que tem a atribuição constitucional de proteger a floresta amazônica, sabotou sua principal fonte de recursos.

Afinal, todo mundo sabe que não adianta esperar pelo aporte do orçamento público, principalmente quando se trata de promover a exploração comercial da biodiversidade florestal e, dessa forma, conter o desmatamento legalizado.

Nada há de ideológico, não precisa mencionar, na estúpida conduta dos gestores, tratando-se tão somente de ignorância, incompetência e descaso.

Claro que o dinheiro do fundo fez (muita) falta. A crise econômica originada pela pandemia só agravou o caos que já estava em curso, e nos últimos 4 anos a tendência de alta que desde 2012 vinha sendo observada na curva do desmatamento se acentuou.

A sustentabilidade na Amazônia em 2023 vai depender da reversão dessa tendência, uma empreitada por si complexa. Mas será apenas o primeiro passo.

A meta é zerar o desmatamento até 2030. Foi esse o nosso compromisso perante o Acordo de Paris.

 

*Engenheiro florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável (UnB).

 

 

 

terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Governo fracassou: de 2019 a 2022, 45.586 km2 de florestas destruídas na Amazônia

* Ecio Rodrigues

Entre 2004 e 2012, com exceção de pequenas oscilações (para cima), a taxa anual de desmatamento sofreu a mais longa sequência de quedas até hoje registrada, chegando ao menor índice já aferido.

Por razões pouco estudadas e por isso ainda inexplicáveis, o ano de 2012 foi o único até agora (desde 1988, quando tiveram início as medições) em que a extensão da destruição florestal na Amazônia foi inferior a 5.000 km2.

A partir daí uma tendência de alta é claramente perceptível na curva do desmatamento, tendo se acentuado depois de 2018.

Essa constatação é preocupante, já que elevações persistentes podem resultar em picos – como o recorde de 1995, quando a destruição assumiu uma proporção alarmante, atingindo 29.059 km2 de área com cobertura florestal, transformada quase que inteiramente em pastagem para criação extensiva de boi.

Ou o recorde de 2004, ano em que o aumento do desmatamento acompanhou o aquecimento da economia brasileira e, em consequência, 27.772 km2 de florestas foram suprimidos por corte raso, desaparecendo do mapa amazônico.

Todos os anos o mundo acompanha a divulgação, pelo Inpe, da taxa de desmatamento, o que ocorre sempre no final de novembro.

Como o combate à devastação florestal é efetuado primordialmente pelo governo federal, é dele o mérito quando a taxa é reduzida, assim como a responsabilidade, nos anos em que se amplia.

Diversamente do que apregoam a imprensa e o movimento ambientalista, todos os anos os governos (o atual e os anteriores) aplicaram recursos na fiscalização.

E se engana quem pensa que se trata de um investimento exíguo, pois não é. Está muito longe da verdade, por sinal. 

Acontece que a maior parte do orçamento na área ambiental é destinada a procedimentos relacionados ao exercício do poder de polícia, tais como compra de equipamentos e viaturas, realização de operações fiscalizatórias, pagamento de diárias etc.

Mas a experiência demonstra que para alcançar êxito, além da destinação orçamentária é preciso também competência – algo que esteve em falta nos últimos 4 anos.

Do ponto de vista institucional, cabe observar que nesse governo as ações de controle do desmatamento ficaram diretamente vinculadas à Presidência, sob a coordenação – um tanto ineficiente, diga-se – do próprio vice-presidente da República.

Nada disso adiantou. A despeito do investimento em fiscalização e dos dispêndios com a intensa atuação do Exército, a gestão que se encerra em 2022 falhou rotundamente no cumprimento da meta estabelecida perante o Acordo de Paris, de conservar a floresta na Amazônia.

Em 2019, primeiro ano do mandato, foram derrubados 10.129 km2 de florestas; em 2020, foram 10.851 km2 e, em 2021, 13.038 km2.

Agora, em 2022, a superfície desmatada totalizou 11.568 km2. Apesar da leve flutuação para baixo, a tendência de alta se manteve – o que só confirma o fracasso do governo em conter o desmatamento e estancar os prejuízos econômicos decorrentes da degradação da biodiversidade florestal.

Fracasso que deveria ser cobrado com firmeza pela imprensa. Afinal, não tem nada a ver com ideologia, é incompetência mesmo.

 

*Engenheiro florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável