quinta-feira, 7 de dezembro de 2017


Vocação florestal do Acre ficou nos palanques
* Ecio Rodrigues
Tema recorrente nos idos da década de 1990, a vocação florestal do Acre, entendida como a possibilidade de lastrear o crescimento do PIB estadual na exploração da floresta, parece ter sido esquecida nas prateleiras dos pesquisadores e nos palanques dos políticos.
Repetida à exaustão naquela época, a tese de que não havia conciliação possível se mostrou correta. Quer dizer, ou a dinâmica econômica se assentaria sobre a pecuária, ou sobre a biodiversidade presente no ecossistema florestal.
O que prevaleceu afinal foi mesmo a criação de gado, sendo que o aproveitamento do ecossistema ficou restrito aos discursos e às pesquisas.
Muitos haverão de argumentar que as águas corriam a favor da criação de boi, e que a correnteza contra a produção florestal era muito forte. Todavia, isso não é bem verdade. A sociedade, por sinal, hipotecou seu apoio, ao votar – não uma, mas várias e repetidas vezes – no grupo político que defendia a navegação rio acima.
Talvez tenha faltado disposição e, o mais grave, competência, para encarar o balseiro de impasses que desciam o rio a favor da pecuária. Afinal, eram muitos.
A superação de um desses impasses se mostrava impreterível – mas, claro!, foi deixada pelo caminho. Tratava-se de evitar a exaustão das terras (cobertas por florestas) entregues à exploração comunitária.
Embora uma quantidade significativa de Reservas Extrativistas tivesse sido criada durante a década de 1990, faltava levar aos assentamentos gerenciados pelo Incra, nos quais a pecuária dominava, a alternativa da produção florestal.
A proposta de uma nova categoria de assentamento rural, como opção para reforma agrária, denominada “Projeto de Assentamento Florestal” (PAF) e especialmente pensada para a Amazônia, poderia afastar o Incra e seus projetos de assentamentos da condição de “vilões “ do desmatamento amazônico.
          Diante do propósito de consolidar a produção rural por meio das florestas plantadas e do manejo das nativas ainda existentes nas áreas destinadas à reforma agrária, a ideia era que os produtores do PAF realizassem uma transição produtiva, abandonando a pecuária mais rápido até que os produtores das Reservas Extrativistas.
          A institucionalização do PAF possibilitou que se radicalizasse na proposta de impor os recursos florestais como única via de produção comercial para os assentados. Significa dizer que os produtores só poderiam integrar o PAF se demonstrassem experiência com a cadeia produtiva florestal, em algum de seus elos.
Para a geração de renda, contava-se com a tecnologia do manejo florestal comunitário para produção de madeira. Desse modo, o Incra entregaria o assentamento aos produtores após a publicação da licença ambiental.
Esperava-se que, de posse do plano de manejo e prevendo-se 10 hectares por família, o produtor tivesse condição de obter uma capitalização inicial, mediante a exploração da madeira, que viabilizasse a consolidação do assentamento florestal nos anos seguintes.
Em termos gerais, o propósito era incluir o PAF no Programa Nacional de Reforma Agrária como modelo de assentamento adequado à realidade florestal da Amazônia, de forma que caísse por terra a polêmica acerca da redução da área de Reserva Legal. Essa redução, contudo acabou ocorrendo no Código Florestal de 2012.
A viabilização do assentamento florestal teria demonstrado que a Reserva Legal de 80% das propriedades privadas (onde a exploração por meio do manejo florestal é permitida e a criação de boi, não) está longe de ser improdutiva, como ainda afirmam alguns políticos.
Mas, nada disso vingou. De lá prá cá, a criação de boi se consolidou e o desmatamento chegou na barreira dos 20% do território estadual. Quanto à vocação florestal do Acre, voltará aos palanques em 2018. Simples assim.


*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.


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