segunda-feira, 16 de março de 2020



2010-19: década perdida para a sustentabilidade na Amazônia (1ª parte)

* Ecio Rodrigues
A segunda década do século XXI foi perdida para a sustentabilidade da Amazônia?
Lamentavelmente, só há uma resposta para essa pergunta: sim! De uma análise dos avanços e recuos observados entre 2010 e 2019, o saldo é negativo para a sustentabilidade da maior floresta tropical do planeta.
Comecemos pelo ano 2010, quando o país alcançou PIB próximo a 8%, de longe o maior da década. A despeito do aquecimento da economia, em 2010 o desmatamento manteve a tendência de queda iniciada em 2005 – reforçando a tese de que é possível conciliar o crescimento econômico com a sustentabilidade ecológica da Amazônia.
O ano de 2010 marca também o início da operacionalização do contrato de concessão da Floresta do Jamari, localizada em Rondônia.
Como apontam os especialistas, a concessão florestal é o mecanismo adequado para ampliar a participação da biodiversidade florestal na dinâmica econômica regional. Sem embargo, apenas em 2006 foi editada a Lei de Gestão de Florestas Públicas, e dois anos depois, em 2008, foi leiloada a Flona do Jamari, a primeira unidade de conservação a ser concedida à exploração privada.
Por outro lado, uma seca extrema levou a um aumento recorde das queimadas em 2010, e o risco de ocorrência de incêndios florestais (como os que aconteceram em 2005) deixou o país e o mundo em estado de alerta.
A seca também dificultou o deslocamento de balsas pelo rio Madeira, isolando o Acre do restante do país. Por conta disso, o abastecimento do estado ficou comprometido por quase 60 dias.
Diante do cenário promissor (legado do ano anterior) de aumento da riqueza e redução do desmatamento, em 2011 a demanda por uma nova política florestal regional surgiu de maneira quase espontânea.
Todavia, essa expectativa não se concretizou, e a sustentabilidade da Amazônia sofreria um significativo revés por efeito do baixo nível técnico que caracterizou as audiências públicas realizadas nas capitais dos nove estados da região para discussão do novo Código Florestal.
O resultado das primeiras votações no Congresso refletiu essa guinada rumo ao retrocesso: seguindo na direção oposta à apontada pela ciência, os deputados aprovaram, por imensa maioria (mais de 400 votos), a redução da faixa de mata ciliar dos rios, além de outras alterações perigosas, relacionadas às áreas de reserva legal e de preservação permanente.
Uma retração drástica no crescimento econômico do país levou a uma redução igualmente expressiva na destruição florestal em 2012 – e pela primeira vez desde que se iniciaram as medições em 1988, o desmatamento na Amazônia abrangeu extensão inferior a 5 mil km2.
Se romper o piso dos 5 mil km2 foi a boa notícia, a má com certeza foi a aprovação do novo Código Florestal, que não chegou nem perto de atender aos anseios dos ambientalistas e dos cientistas.
Entre outros anacronismos, a nova legislação desconsiderou a importância das florestas especiais presentes em APP e áreas de reserva legal, e recuou em relação à promoção de uma economia ancorada na biodiversidade florestal da região.
Especificamente no caso do Acre, 2012 traria ainda a infeliz decisão do governo estadual de extinguir a Secretaria de Florestas, SEF, a primeira e única, em toda a Amazônia, voltada para o trato dos temas florestais – o que, por si, já seria forte justificativa para sua manutenção.
O fim da SEF jogou por terra uma experiência exemplar e estratégica para a região, de gestão da produção florestal em âmbito estadual.
A reversão da tendência de queda na destruição florestal e o início de um lento porém persistente ciclo de aumento na taxa de desmatamento marcou o ano de 2013, mas isso é assunto para outro artigo.

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.


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