* Ecio Rodrigues
Em maio de 2012, depois de mais de 5 anos de
discussões, o Congresso aprovou a Lei 12.651/2012 – o terceiro Código Florestal
a entrar em vigor no país.
Apenas a título de esclarecimento, o primeiro
estatuto florestal de caráter nacional data de 1934 e foi imposto à sociedade
por meio de decreto presidencial (Dec. 23.793/1934).
Já naquela época, a motivação social e econômica
para estabelecer regras de conservação das florestas residia na indispensabilidade
de criação de áreas legalmente protegidas, como é o caso das áreas de reserva
legal e de preservação permanente.
Dessa forma, a norma fixou limites para a ocupação
do solo e uso dos recursos naturais, e sob o descontentamento dos criadores de
gado instituiu a (hoje denominada) reserva legal, proibindo o desmate – por conseguinte,
a instalação de pecuária extensiva – em mais de ¾ da área total das
propriedades cobertas por florestas, como meio de garantir o abastecimento de
madeira e lenha.
De outra banda, o decreto também obrigou a
manutenção de uma faixa de floresta nativa às margens dos rios e igarapés, faixa
esta que posteriormente recebeu a denominação de “mata ciliar”.
Obviamente, a introdução da APP de mata ciliar
também não foi bem recebida pelos pecuaristas, sob o argumento de que prejudicava
a dessedentação dos rebanhos, diante da alegada dificuldade que o gado teria para
atravessar a vegetação e chegar aos cursos d’água.
O segundo Código Florestal brasileiro foi promulgado
em 1965 (Lei 4.771/1965), quando a destruição da floresta amazônica já começava
a ganhar visibilidade. E embora houvesse disponibilidade de terras na região,
novamente a controvérsia se concentrou nos dois assuntos: APP de mata ciliar e reserva
legal –que foi ampliada para 80% da área total de cada propriedade rural
situada na Amazônia.
Não seria diferente com o Código aprovado em 2012. A
despeito das inovações trazidas, o debate mais uma vez se voltou para a extensão
de terra coberta por florestas a ser obstada à atividade pecuária, na forma de reserva
legal e APP.
Assim, poucos se deram conta do avanço representado
por mecanismos como a Compensação Ambiental, a Cota de Reserva Ambiental (CRA) e
o Cadastro Ambiental Rural (CAR) para a gestão da propriedade, a conversão da
reserva legal em ativo econômico de peso e o macroplanejamento da ocupação do
espaço rural na Amazônia.
Em relação aos 10 anos do Código Florestal de 2012,
duas avaliações são costumeiras.
A primeira sugere que até hoje não houve
implementação, não tendo o regulamento alcançado eficácia plena, por conta da
demora no julgamento das ADIs que questionaram diversos dispositivos – o que
veio a ocorrer apenas em 2018, quando o STF decidiu pela constitucionalidade da
lei como um todo (leia mais sobre o julgamento no STF em Associação
Andiroba).
A segunda avaliação, por sua vez, considera que a nova
legislação, longe de conter, promoveu o desmatamento na Amazônia – contrariando
o seu objetivo primordial de reverter a tendência de ampliação da pecuária
extensiva e, consequentemente, estancar a destruição florestal causada por essa
atividade.
Reforça essa análise a circunstância de que 2012, o
ano da promulgação, foi o único – até hoje – em que o desmatamento atingiu uma área
de floresta inferior a 5.000 km2. 2012 ficou marcado ainda pela
associação entre retração do PIB e considerável aumento do investimento público
em fiscalização, ocorrência insólita na história econômica da Amazônia.
A partir daí, salvo leves flutuações, a tendência
de elevação do desmatamento é facilmente perceptível nas medições anuais
realizadas pelo Inpe.
Enfim, pode ser que o STF tenha demorado em demasia
para declarar a constitucionalidade do Código Florestal; pode ser também que a
segurança jurídica decorrente de sua aprovação tenha contribuído para as
crescentes taxas de desmatamento na Amazônia.
Sem embargo, o fato relevante a considerar é que
esse crucial ordenamento jurídico ainda não alcançou o seu propósito
fundamental – que consiste, essencialmente, em ampliar o valor de mercado da
biodiversidade florestal da Amazônia, a fim de torná-la mais atrativa, perante
o investimento privado, do que a criação extensiva de boi, e de maneira a
reverter, no curto prazo, as taxas anuais de desmatamento.
Esse propósito, diga-se, foi reforçado pelo Acordo
de Paris em 2015.
A expectativa é que o Código Florestal se consolide,
no curto prazo, como principal instrumento e referência para a conservação da
biodiversidade florestal na Amazônia.
Por seu turno, o mercado de carbono, previsto ali e
no Acordo de Paris, é o caminho para o desmatamento zero. É esperar para ver.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre,
engenheiro florestal (UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em
Desenvolvimento Sustentável (UnB).
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