* Ecio Rodrigues
Classificado
como “ouro branco” no final do século XVII, o látex oriundo da árvore de
seringueira fez surgir o mais importante e duradouro ciclo econômico da
Amazônia – que proporcionou à região uma riqueza jamais
igualada por nenhum outro produto do setor primário.
Basta
dizer que as receitas geradas no período superam em muito os ganhos decorrentes
da exportação das drogas do sertão, do cacau nativo e mesmo das espécies madeireiras,
incluindo o mogno.
Embora existam
divergências relacionadas às datas de início e termo final, parece ser consenso,
entre os pesquisadores que se dedicam ao tema, que a história econômica da
Amazônia registra, na verdade, dois ciclos da borracha – ou seja, dois
intervalos de tempo distintos, marcados por pico de produção e de exportação.
O mais
longo e profícuo, que perdurou por mais de 30 anos, iniciou-se nos idos de 1880,
quando ocorreram as primeiras remessas (para Boston, EUA), tendo vigorado até
1911.
A partir
daí, os seringais cultivados na Malásia pelos engenheiros florestais ingleses começaram
a dominar o comércio internacional, condenando os seringais nativos a um declínio
fulminante e irremediável.
Posteriormente,
e de maneira excepcional, a convulsão econômica trazida pela eclosão da Segunda
Guerra deu uma sobrevida ao látex extraído da Hevea nativa – que voltou
a abastecer o mundo, retomando assim, por um breve período (de 1940 a 1945), sua
relevância comercial.
Com o fim
da guerra, todavia, a derrocada foi definitiva e a seringa amazônica
desapareceu do mercado mundial.
Dessa
forma, a contar de 1912, os seringais amazônicos entraram em colapso (situação
em que permaneceram até 1939 e para a qual retornaram após 1945), impondo à região
uma perdurável letargia econômica e legando um excedente de trabalhadores
desocupados e sem perspectivas de recolocação no setor primário.
No
decorrer dos anos, estados como Pará e Amazonas, mais bem posicionados
estrategicamente (em termos de ligação fluvial ou rodoviária com o Sudeste do país),
conseguiram superar essa letargia, mas em outros a pobreza persistiu e a
economia nunca chegou nem perto da pujança alcançada
nos tempos áureos.
Especificamente
no caso do Acre, até meados da segunda metade do século XX a geração de
empregos e de riqueza continuaria vinculada à decadente extração de borracha –
que, por sua vez, passou a operar sob ganhos bem reduzidos (eis que a exploração
dos seringais nativos importa em custos elevados) e a depender continuamente,
todos os anos, do suporte financeiro de Brasília.
Por mais
que alguns autores batam na tecla do abandono da produção gomífera por parte do
governo federal, não é isso que demonstram as estatísticas e fatos históricos.
Acontece que
ao longo das décadas diversos instrumentos de política pública foram instituídos
com a finalidade de possibilitar a transferência de recursos ao estado e dessa
forma manter o cambaleante mercado de borracha nativa.
Até a
década de 1970, os repasses eram efetuados por meio dos então vigentes Planos
de Valorização Econômica. Depois, passaram a se dar via Probor - Programa de
Incentivo à Produção de Borracha Natural, que tinha o objetivo de promover a
domesticação e o cultivo comercial da seringueira.
O apoio
fornecido pela política pública perdurou no tempo e ainda hoje se processa por diversos
meios – tais como concessão de subsídios (como o outorgado em 1999) e investimento
na criação e estruturação de reservas extrativistas.
Entretanto,
mesmo sob esse significativo e permanente arrimo, a borracha nativa do Acre continua
agonizante e nunca voltará a alcançar alguma
relevância econômica, muito menos chegará a competir com a cultivada nos seringais
de São Paulo, que desde 1993 batem o próprio recorde anual de produção.
Poucos
pesquisadores se atentam para esse aspecto, contudo, durante o ciclo da
borracha, tanto os seringalistas (na condição de patrões) quanto os
seringueiros (na condição de trabalhadores) atuavam no sentido de conservar as
árvores, isto é, reduzindo o risco de exaustão e, por conseguinte, de extinção
da espécie.
A seringueira
do Acre nunca correu risco de supressão ecológica, mas o produto borracha
nativa foi comercialmente extinto, e já não existe para o mercado.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal (UFRuRJ), mestre
em Política Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável (UnB).
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