terça-feira, 23 de junho de 2020



Legal ou ilegal, missão do MMA é zerar desmatamento na Amazônia
* Ecio Rodrigues
Em 2019, as medições realizadas pelo reconhecido Inpe detectaram significativo aumento nas taxas de desmatamento na Amazônia, inclusive em unidades de conservação – como a reserva extrativista Chico Mendes, localizada no Acre.
Fazendo uso da estratégia bastante equivocada de contrapor um problema com outro, bem ao estilo “soltar um bode na sala”, em resposta aos números alarmantes divulgados pelo Inpe, o Ministério do Meio Ambiente, MMA, rebateu que boa parte do desmatamento medido era legalizada, ou seja, realizada sob o amparo do Código Florestal e normas correlatas.
Acontece que não é possível, atualmente, pelo menos no decorrer do mesmo ano da medição, diferenciar o desmatamento legalizado do ilegal (praticado ao arrepio da legislação).
Ademais, essa diferenciação é importante para o planejamento de políticas públicas, todavia, o MMA tem como missão institucional zerar o desmatamento – todo desmatamento, não importando se ilegal ou legalizado.
Com efeito, o que vai variar é apenas a forma de enfrentamento. No primeiro caso, o MMA pode lançar mão da fiscalização para conter e penalizar os produtores infratores; no segundo, fiscalizar não resolve, é necessário fomentar a exploração da biodiversidade florestal, de modo a desmotivar o produtor a investir na criação de boi, oferecendo-lhe alternativa de renda.
Por fim, todo desmatamento realizado numa reserva extrativista é ilegal. Afinal, na condição de categoria especial de unidade de conservação, a resex goza de proteção legal contra desmatamento e queimada.
Para explicar melhor. A Lei 9.985/2000, aprovada com o dispêndio de muito esforço e tempo por parte dos nossos deputados e senadores, instituiu o Snuc (Sistema Nacional de Unidades de Conservação), no intuito de segregar e proteger os ecossistemas considerados especiais, seja por atributos biológicos ou físicos, seja por seu significado para as populações tradicionais.
Sob o manto do Snuc, portanto, expressiva porção do território nacional, organizada fundiariamente na forma de unidades de conservação, foi excluída do modelo de ocupação produtiva baseado no desmatamento para instalação de pasto e cultivo de grãos. Significa dizer que dentro dessas áreas não podem ocorrer as atividades produtivas ordinariamente praticadas do lado fora – a saber, criação de boi e plantio de commodities agrícolas (cana, milho, soja etc.).
Hoje, as unidades de conservação estão presentes nos 5 mais importantes biomas nacionais e, no caso da Amazônia, a meta é segregar, no mínimo, 20% das terras com florestas, mediante a criação, entre outras categorias de UC, de parques nacionais, estações ecológicas e (a mais importante do ponto de vista social) reservas extrativistas.
Enfim, para resumir e tirar o bode da sala:
1) Não é porque o desmatamento é legalizado que não deve ser combatido, sendo que os gestores ambientais têm a responsabilidade de zerar o desmatamento na Amazônia, pouco importando sua origem.
2) Dentro do perímetro das reservas extrativistas, todo e qualquer desmatamento pode ser, de pronto, considerado ilegal, competindo ao MMA, por meio do ICMBio, o órgão responsável pelo gerenciamento dessas áreas, tomar as medidas para coibir essa prática nociva.
No caso da Chico Mendes, a primeira reserva extrativista criada no país, um verdadeiro símbolo para a Amazônia, não há o que tergiversar, o MMA precisa agir já, antes que a área de floresta desmatada no lado de dentro da resex supere a devastada no lado de fora.  
         
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.




Nenhum comentário:

Postar um comentário