* Ecio Rodrigues
Entre
agosto/2018 e julho/2019 foram desmatados 682 km² de florestas no Acre. Foi a
maior área devastada desde 2004 – a despeito da tendência de alta observada a
partir de 2013.
Com
a divulgação da taxa de 2020, constata-se que o desmatamento manteve a mesma
intensidade do ano passado, tendo atingido 652 km² de florestas. Considerando o
período abrangido pela medição (agosto/2019 a julho/2020), integralmente sob a
responsabilidade do atual governo, é possível concluir que a conservação da
biodiversidade florestal permanece sem ser prioridade no Acre.
O
fato de os índices de devastação retrocederem aos níveis da década passada, que
se supunham superados, acende o alerta. Além de representar atraso inadmissível
na política pública de meio ambiente, há o risco imediato de ocorrência de uma
taxa de desmatamento de 4 dígitos. Sem falar da descrença da sociedade em
relação ao futuro das florestas.
Não
se pode esquecer que em 2003 o Acre superou a barreira dos 1.000 km² de
destruição florestal. Para conter a tendência de alta e lograr rebaixar a taxa de
desmatamento foram consumidos expressivos recursos na criação de aparato
fiscalizatório. Todavia, e como apontam as evidências, o efeito trazido pela
fiscalização é de curto prazo.
Existe
farta evidência técnica, de outra banda, no sentido de que o agronegócio
depende do desmatamento para se viabilizar. Talvez reconhecer essa dependência seja
o primeiro passo, como informam os guias de autoajuda, para iniciar uma
discussão aprofundada e, a partir daí, quem sabe chegar a uma solução.
Dessa
forma, e assumindo que o agronegócio é, atualmente, prioridade para a economia
do Acre e que mais de 80% da área ocupada por essa atividade produtiva é
destinada à criação extensiva de gado – um empreendimento, diga-se, que fornece
retorno questionável à sociedade –, facilmente se deduz que porção
considerável florestas será substituída
por pasto nos próximos anos.
Ora,
há que se convir que se trata de um cenário desolador, que pode fazer surgir uma
geração de acreanos “sem-sem” – para usar um jargão caro aos demógrafos.
Sem
emprego no presente, sobrevivendo numa economia estagnada, e também sem poder
contar com a biodiversidade florestal, principal recurso estratégico do estado e
garantia para as gerações futuras.
Para
explicar. Se a economia continuar a depender da criação extensiva de gado, não
haverá saída, ou mudança para melhor. A estagnação econômica permanecerá, e de
igual modo continuará a pressão pela conversão da floresta em pasto, a fim de
atender à demanda da pecuária por novas terras.
Continuaremos,
por um lado, a depredar a valiosa biodiversidade florestal e, por outro, sem
gerar riqueza suficiente para fortalecer a economia do estado e oferecer opção
de emprego e renda aos acreanos.
Por
muito tempo acreditou-se – e ainda há quem acredite – que os governos poderiam
conter o desmatamento promovendo a ampliação da produtividade da pecuária (a
fim de aumentar a quantidade de cabeças de gado por hectare). Significa
afirmar, em outras palavras, que o fomento à pecuária inibiria a devastação
florestal.
Mas
a persistência de elevadas taxas de desmatamento demonstrou a insensatez dessa
tese.
Na
verdade, a raiz do problema é econômica. Mesmo que se estimule o desmatamento legalizado,
o que não deixa de ser paradoxal, e se penalize o ilegal, que ninguém sabe
direito onde ocorre, enquanto a pecuária extensiva se mostrar mais lucrativa
para o produtor e, pior, para o Basa, que fornece financiamento com crédito
subsidiado para a criação de gado, não haverá resposta.
Fazer
a biodiversidade florestal gerar mais rendimentos que os ganhos de curto prazo trazidos
pelo boi criado solto em 2 hectares de pasto é a única e providencial saída
para cançar o desmatamento zero no Acre. Por mais que pareça utópico, não
existe plano B, e o tempo urge.
O
negócio da biodiversidade florestal no Acre precisa ser viabilizado, e já!
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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