* Ecio Rodrigues
Quando
a comitiva oficial de gestores e políticos do Acre chegou à COP 26 (encerrada na
Escócia em 12 de novembro), ainda não haviam sido divulgados os dados relativos
ao desmatamento na Amazônia em 2021 – o que evitou, para dizer o mínimo, muito
constrangimento.
Conforme
apurado pelo conceituado Inpe, 871 km² de florestas nativas foram destruídas no
Acre no período entre 1º de agosto de 2020 e 31 de julho de 2021.
Trata-se
de um índice 23% maior do que o computado em 2020, mas, a despeito desse
aumento absurdo, o assunto foi ignorado pela imprensa local.
Com
respaldo em robusta pesquisa, pode-se afirmar que os perversos efeitos do
desmatamento são irreversíveis, ou seja, para a perda de biodiversidade
florestal não tem volta. Uma vez feito o estrago, já era!
Decerto
haverá quem argumente que boa parte da conversão de floresta em pasto se deu
sob a chancela do Código Florestal – o dito desmatamento legalizado.
Além
do fato de que a preocupação do resto da humanidade – inclusive dos fundos de
investimento que gerenciam o dinheiro do mundo – é com a área total de florestas
perdidas, a controvérsia em torno da legalidade/ilegalidade serve apenas para
reforçar nossa incapacidade para solucionar o problema.
Nesse
ponto, supondo que mais de 50% de toda a extensão de terras desmatadas em 2021
seja resultado de procedimento de licenciamento ambiental, cabe indagar se a
sociedade no Acre concorda com a destruição anual de cerca de 400 km² de
florestas.
Há
muito apresentando estatísticas de geração de emprego e renda abaixo da média observada
na Amazônia, o Acre vem chamando a atenção dos que se dedicam ao estudo da
dinâmica do desmatamento por conta de duas características singulares: participação
não contabilizada de áreas inferiores a 6 hectares no cálculo total de
florestas desmatadas; e relação inversamente proporcional entre PIB e
destruição florestal.
Enquanto
na Amazônia como um todo essa inversão de proporcionalidade ocorre de maneira inusual,
no caso do Acre ela tem sido frequente. Mesmo sob retração econômica persistente,
os produtores se sentem motivados a investir para ampliar a produção,
derrubando a floresta e aumentando os pastos.
A
motivação pode vir do discurso de incentivo reiterado pelos governos estadual e
municipal e por políticos de todos os partidos; pode vir da disfuncionalidade do
mercado imobiliário, que valoriza mais a terra nua, sem cobertura florestal;
pode vir do crédito subsidiado fornecido pelo FNO – ou de todas essas condições.
Enfim,
ainda não é possível saber ao certo as razões pelas quais o investimento em desmatamento
no Acre é tão elevado, recorrente e, o mais grave, parece não depender do comportamento
do PIB estadual.
Mais
complexo ainda é incluir os roçados no cômputo da superfície total desmatada. O
Inpe dispõe de tecnologia de ponta em sensoriamento remoto e georreferenciamento
por satélite, no entanto, a aferição de clareiras com menos de 6,25 hectares importa
em custos anuais incompatíveis com a disponibilidade orçamentária do órgão.
Na
realidade rural do Acre, afastando-se do eixo das rodovias pavimentadas (em
especial as BRs 364 e 317), onde se localizam as grandes propriedades ocupadas
pela pecuária extensiva, o desmatamento é praticado por colonos dispersos em
ramais e, o pior, por ribeirinhos que habitam colocações às margens dos rios.
As
evidências indicam que a participação desses produtores na taxa anual de
desmatamento é bem maior do que os gestores e os ambientalistas imaginam.
Aferir
essa dinâmica pode representar o sucesso ou o fracasso da política pública para,
um dia, o Acre chegar a zerar o desmatamento e não se envergonhar perante o
mundo.
*
Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal,
Mestre em Política Florestal pela UFPR e Doutor em Desenvolvimento Sustentável
pela UnB.
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