* Ecio Rodrigues
Para
que a discussão em torno do futuro da Amazônia avance é preciso levar em conta duas
constatações comprovadas em teses de doutorado e pesquisas científicas consumadas
no âmbito de instituições do porte da Embrapa e do Inpa, que gozam de amplo
reconhecimento internacional.
Em primeiro
lugar, o desmatamento é de longe o maior problema social, econômico e ecológico
da região, sendo que a superação desse problema depende de um esforço concentrado
de políticas públicas.
Em segundo
lugar, a principal responsável pelo desmatamento é a pecuária extensiva
praticada nos moldes atuais, ou seja, uma atividade que ostenta produtividade
sofrível (2 hectares de pasto por cabeça), que só se viabiliza porque conta com
fartura de terras e crédito barato assegurado pelo FNO, além de não pagar pela
água que o boi bebe.
Só
quando essas premissas forem reconhecidas e assumidas, os políticos e os
gestores por eles nomeados entenderão que para alcançar o desmatamento zero –
uma imposição do mundo aos brasileiros, sobretudo a partir da celebração do
Acordo do Paris em 2015 – é imprescindível, antes de tudo, desincentivar a primitiva
prática da criação extensiva de boi.
Uma
decisão complexa, que requer compreensão da dinâmica do desmatamento na
Amazônia.
Os
dados coletados pelo conceituado Inpe desde 1988 demonstram que, da mesma maneira
como acontece em quase toda análise estatística de eventos sociais e
econômicos, a curva do desmatamento exibe uma porção inercial.
Esse
efeito inercial aparece justamente porque a resolução de desmatar é uma decisão
privada de investimento e, em tal condição, envolve análise precedente de custos
e receitas, o que o produtor costuma fazer no ano anterior.
Não
é por acaso que se deita ênfase, aqui (como também em todos os outros artigos publicados
neste espaço), na motivação econômica da destruição florestal.
Explicando
melhor. O produtor que pretende ampliar seu pasto e, por conseguinte, seu gado (quase
sempre usando o fogo para limpar o solo antes de plantar capim), precisa
planejar o investimento com pelo menos um ano de antecedência.
Significa
dizer que o desmatamento de 2023 está sendo decidido agora.
Cumpre
enfatizar que o boi solto no pasto domina a paisagem rural da Amazônia, sendo
encontrado nas grandes propriedades, que somam mais de 1.000 hectares, mas
também nas pequenas, que não chegam a 100 hectares.
Por sinal,
está na agricultura familiar e nos pequenos rebanhos o maior entrave para a
redução – muito necessária – do crédito rural disponibilizado pelo Pronaf, que
prioriza o exercício da pecuária extensiva.
É
inegável, claro, a importância social do gado para o pequeno produtor. Entretanto,
sob essa justificativa vão se criando cada vez mais empecilhos que entravam a restrição
do financiamento público oferecido à pecuária e, em consequência, ao
desmatamento.
Enfim,
por um lado, encarar o desafio de reduzir de maneira drástica o apoio estatal à
criação extensiva de gado significa enfrentar o poder político dos pecuaristas.
Por
outro, significa enfrentar o poder político da agricultura familiar. Afinal, é equivocada
a ideia recorrente de que apenas a grande propriedade cria boi e desmata.
A
empreitada, há de se convir, não é nada animadora. Mas não existe plano B.
A
conclusão é simples. Para alcançar o desmatamento zero na Amazônia, o crédito fornecido
ao boi solto no pasto também deve ser zerado. Para os grandes produtores e para
os pequenos.
Quem
é capaz de vencer esse desafio? Pense na Amazônia e vote por ela.
*Engenheiro florestal
(UFRuRJ), mestre em Política Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento
Sustentável (UnB).
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