* Ecio Rodrigues
Derramar lágrimas pelas mazelas
que afligem o Acre é uma demonstração de solidariedade. Só isso. Na lista de
tragédias que pode parecer interminável somou-se a alagação – que não houve em
Rio Branco, diga-se, mas aconteceu em Tarauacá. Então, vamos lá. Queimadas, desmatamento,
haitianos, covid, dengue, seca – e alagação. Flagelos que certamente podem se
amenizados pela solidariedade da população do estado e do restante do país.
Jamais resolvidos. A solução existe, mas para se tornar realidade depende de
uma equipe de gestores públicos com capacidade técnica e competência.
Publicado originalmente em 12/04/2015,
esse artigo discute as soluções para o caso das secas e alagações, sintetizadas
no que os autores chamaram de resistência pública e resiliência do rio.
Como tudo na vida, a alagação e a seca que atingem
os rios na Amazônia têm causa e consequência.
Para resolver o problema de maneira definitiva, sem
paliativos, as ações de política pública devem ser direcionadas no sentido de
abolir as causas e de tornar as consequências aceitáveis para a sociedade.
Para além da assistência prestada aos atingidos
pelas alagações, e das medidas de racionamento adotadas em função da seca, a
atuação da gestão pública deve se pautar por dois tópicos bem demarcados:
resistência pública e resiliência dos rios.
A resiliência dos rios, vale dizer, sua capacidade
de reagir às flutuações extremas de vazão, está no cerne da questão: a
ampliação dessa resiliência é a saída para restabelecer o equilíbrio
hidrológico dos cursos d’água, atacando-se o problema pela causa.
É preciso ter em conta, por outro lado, que, quando
se trata do desequilíbrio hidrológico dos rios e da alteração drástica do
regime pluviométrico – fatores que explicam tanto a seca nas represas do
Sudeste quanto a alagação nos rios do Acre –, é necessário um intervalo de
tempo relativamente elástico para solucionar as causas. Nesse período, a
população terá que conviver com algum tipo de transtorno – e é aí que entram as
ações de resistência pública.
O passo inicial e decisivo para a resistência
pública é o reconhecimento de que eventos extremos, como as alagações e
sobretudo as secas, deixaram de ser sazonais – ou seja, já não obedecem a
interstícios de ocorrência de 10 anos ou mais. Esses eventos, desde pelo menos
os últimos 5 anos, têm incidência anual, já não podem causar espanto; ninguém
pode alegar, tampouco, que foi pego “desprevenido”.
É necessário levar a cabo, portanto, medidas
imediatas – no propósito, entre outros, de promover a desocupação dos terrenos
alagadiços; de efetuar a urbanização dessas terras para o fim de convertê-las
em áreas verdes; de fomentar a arborização urbana, melhorando os indicadores
que medem o número de árvores por habitante.
O planejamento da resistência pública envolve ainda
o monitoramento permanente das condições de pluviosidade, de modo a se obter um
conjunto de dados cada vez mais preciso. Para tanto, é indispensável o
investimento na aquisição de equipamentos e na contratação de técnicos e
especialistas.
Mas o maior desafio da gestão pública está mesmo no
embate para resolver as causas do desequilíbrio hidrológico dos rios, por meio
da ampliação de sua resiliência.
Nesse quesito, a providência primeira diz respeito
ao alargamento do calado, com a retirada e dragagem do material acumulado no
leito ou no fundo do rio. O período de seca é a época ideal para esse tipo de
medida – que, sabe-se lá por que cargas d’água (com o perdão do trocadilho),
nunca chegou a ser efetivada.
A etapa seguinte envolve a restauração florestal da
mata ciliar. Sem embargo das dificuldades políticas que resultaram nas abstrusas
definições contidas no Código Florestal a respeito da largura mínima da faixa
de mata ciliar, parece ser consenso no meio científico de que essa “largura
legal” perdeu a validade.
Será necessário calcular uma “largura técnica”,
isto é, a largura ideal que a faixa de mata ciliar deverá ter em cada município
situado ao longo da bacia do rio Acre, a fim de ofertar, com maior eficiência,
o serviço de equilíbrio hidrológico do rio. Uma nova negociação política, mais
sóbria, se faz urgente.
Por fim, não se pode esquecer: queimadas nunca
mais! É melhor aproveitar o ensejo para banir de vez essa prática nefasta.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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