* Ecio Rodrigues
De
uma análise ligeira constatam-se 3 pontos de inflexão na curva do desmatamento
da Amazônia.
Os
dois primeiros se referem aos níveis recordes de desmatamento alcançados em 1995
e 2004. O terceiro, por outro lado, marca o ano de 2012, o único (até hoje) em que
a destruição florestal atingiu uma área inferior a 5.000 km2.
As
estatísticas demonstram com clareza que a fiscalização ajuda, todavia – e a
despeito de impingir altíssimos custos ao orçamento público, tanto na esfera
federal quanto no âmbito dos 9 estados amazônicos – está longe de ser a saída para zerar o
desmatamento na região.
O
caso do recorde de 1995 é exemplar para entender o efeito da fiscalização. Em
decorrência da intensa ação fiscalizatória levada a cabo no período
pós-recorde, a taxa de desmatamento sofreu queda abrupta em 1996; contudo, já a
partir de 1998 se observa a retomada da tendência de alta.
Ou
seja, ainda que as ações de controle produzam efeito imediato, levando o desmatamento
a cair, a tendência de queda não se mantém por muito tempo, por uma razão
simples, a fiscalização intimida e pressiona o produtor, mas não lhe oferece alternativa
de renda.
Sob poucas
variações, esse cenário se repetiu depois do recorde de 2004 e permaneceu até 2012,
quando o desmatamento atingiu o menor nível já aferido. A partir de 2013, teve
início uma retomada lenta, porém persistente, da destruição florestal na
Amazônia.
A conclusão,
um tanto óbvia, é que só será possível estancar, reduzir e zerar o desmatamento
(o ilegal e o legalizado) mediante a valorização econômica da biodiversidade
florestal.
Explicando
melhor. Compete à política pública promover e fomentar um modelo de ocupação
produtiva que leve em conta, na planilha de custos dos empreendimentos, as
externalidades sociais e ambientais decorrentes da destruição florestal.
A
teoria econômica disponibiliza mecanismos direcionados a minimizar os efeitos
das externalidades geradas pelas atividades produtivas – em especial, no caso
da Amazônia, a criação extensiva de boi.
Tais
mecanismos podem ser classificados em dois grandes grupos: comando/controle e
poluidor/pagador.
São
inerentes ao comando/controle (até agora priorizado pela política pública, mas,
como dito, sob resultados questionáveis) as ações relacionadas à fiscalização e
ao exercício do poder de polícia, como autuação e cominação de multa.
Diferentemente,
o princípio do poluidor/pagador se volta para impor ao empreendedor os custos associados
aos impactos sociais e ambientais causados pelo seu empreendimento. Em resumo, os
instrumentos baseados nesse princípio se destinam a taxar as atividades poluidoras
e premiar as atividades limpas.
O
cardápio disponível para o gestor público é variado e extenso, e inclui desde a
oferta de crédito mais barato às iniciativas que contribuem para a
sustentabilidade até a taxação das atividades predatórias – o desmatamento
legalizado, por exemplo.
No princípio
do poluidor/pagador se insere o instrumento denominado Pagamento por Serviços
Ambientais, ou PSA, que garante ao produtor uma remuneração pela oferta de
serviços ambientais, em especial os relacionados à qualidade da água, do ar, e
à conservação da biodiversidade florestal.
Nesse
sistema, portanto, o produtor tem a opção de, ao invés de desmatar, ganhar
dinheiro com o manejo da área de floresta presente em sua propriedade, a fim de
retirar carbono da atmosfera e contribuir para a melhoria da qualidade do ar e,
claro, para a sustentabilidade do planeta.
Se,
eventualmente, a área de floresta conservada corresponder à mata ciliar, o
manejo será orientado para melhorar a qualidade da água fornecida à população urbana
localizada a jusante da propriedade.
Para
o funcionamento do sistema PSA é necessário estabelecer um fluxo contínuo e
permanente de recursos, de forma a possibilitar que o dinheiro desembolsado
pelo comprador do crédito de carbono, depois de passar por uma instituição de
validação da transação, venha a ser depositado na conta do produtor.
Esse
fluxo, contudo, jamais chegou a ser viabilizado. É provável que a saída esteja
na comercialização dos créditos nas bolsas de valores, como preconiza o modelo
adotado pelos países que já ingressaram no mercado de carbono.
Um
passo significativo foi dado durante a COP 26, realizada ano passado na
Escócia, ocasião em que foi reforçada a importância do mercado de carbono em
relação às metas assumidas no Acordo de Paris.
Não apenas
o PSA, mas também outros instrumentos conexos ao princípio do poluidor/pagador
podem ser introduzidos na região, com o objetivo precípuo e urgente de superar
as fragilidades do modelo baseado na fiscalização. Este, sim, exibe gargalos
comprovadamente intransponíveis.
Afinal,
mesmo depois de 40 anos de fiscalização, autuação e imposição de multas, o
desmatamento na Amazônia se mostrou mais persistente que os governos, todos
eles.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal (UFRuRJ), mestre
em Política Florestal (UFPR) e doutor em Desenvolvimento Sustentável (UnB).
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